Roberto Jefferson e Jair Bolsonaro: dois líderes que a extrema-direita merece | Autor: Williams Monjardim

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Roberto Jefferson e Jair Bolsonaro:
dois líderes que a extrema-direita merece

Autor: Williams Monjardim1
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Nos últimos dias, presenciamos duas cenas elucidativas acerca do caráter de alguns líderes que ocupam o primeiro plano do cenário político nacional: uma, antes das eleições, protagonizada por Roberto Jefferson; outra depois, protagonizada por Jair Bolsonaro. Vamos a elas.

Jefferson, após saber da existência de uma ordem de prisão expedida pelo juiz Alexandre de Moraes, recebeu os agentes da Polícia Federal que foram à sua casa prendê-lo, a tiros e granadas. Em seguida, gravou e divulgou um vídeo onde afirmou não aceitar mais aquilo que qualificava de “perseguição” e acrescentou que não suportaria perder a liberdade “em favor da tirania”. Deu claramente a entender que não sairia vivo de casa e conclamou seus apoiadores a seguirem seu exemplo e resistirem até às últimas consequências aquilo que chamava constantemente de “opressão” e “tirania”. Cristiane Brasil, sua filha e ex-deputada federal, enquanto acompanhava e aguardava o desenlace da situação, gravou outro vídeo onde também afirmou peremptoriamente que seu pai não se entregaria. Pois bem, algum tempo depois, aquele que não se entregaria e chamou outros a resistirem até o fim, não resistiu e se entregou. É claro, não sem antes manter certa atitude amistosa de confraternização com os policiais que o foram prender.

Jair Bolsonaro, após divulgado pelo TSE o resultado final das eleições, ocasião em que foi declarada sua derrota, permaneceu 44 horas recluso e em silêncio. Nas horas que se seguiram à divulgação do resultado, enquanto todo o país aguardava com certa ansiedade a manifestação do presidente, a primeira manifestação do casal que o ocupa (por enquanto) o Palácio do Planalto veio da primeira-dama. Ela candidamente transcreveu o Salmo 117 em sua conta no Twitter. Nessa ocasião, quando o silêncio ainda pesava o ar, fez-se supôs uma série de significados ocultos às palavras bíblicas. Finalmente, quase dois dias depois, ao romper o silêncio, Bolsonaro convocou a imprensa e fez uma declaração de dois minutos. Uma declaração minúscula com significado menor ainda. O silêncio rompido de modo tão breve também fez supor grande importância ao que não dito. Uma pequena curiosidade que ainda não vi apontada em nenhum lugar. O salmo escolhido por Michele Bolsonaro e que foi transcrito em sua íntegra, é o menor salmo e também o menor capítulo da Bíblia. Com isso temos uma declaração pífia precedida pelo menor dos salmos.

Em ambos os casos o que ficou evidenciado de modo patente foi a covardia. Roberto Jefferson poderia ter-se deixado ir preso pacificamente, não sem antes, por exemplo, convocar a presença da imprensa como parte da negociação para sua entrega. No momento oportuno, poderia reafirmar em alto e bom som todas as coisas que motivaram sua prisão, poderia alegar perseguição, censura, tirania, ou qualquer outra coisa que lhe passasse pela cabeça, por mais insana que fosse. Se o fizesse, sairia como herói aos olhos de seus apoiadores. No entanto, preferiu uma saída cinematográfica, encarou os policiais à bala e não teve coragem de levar sua decisão às últimas consequências (como sugeriu aos seus apoiadores que o fizessem), quer seja tombando após terem-se acabado as balas, quer seja reservando a última para si. Nestes casos teria terminado tragicamente o filme de sua vida – o que até, diga-se de passagem, teria sido um desfecho razoavelmente natural se considerado a escolha do enredo –  e teria entrado para a história como mártir. Mantidas as proporções de dimensões astronômicas, seria uma espécie de atualização de Salvador Allende, no Palacio de la Moneda, ou de Getúlio Vargas, no Palácio do Catete, a depender da escolha. No entanto, preferiu outra solução: acovardar-se e, após todo o espalhafato inicial, terminar por aceitar o que, segundo ele mesmo, era inaceitável.

O caso Bolsonaro é menos teatral e mais covarde. Durante os quatro anos em que exerceu a presidência da república, e até mesmo antes disso, lançou contínuas dúvidas sobre as urnas eletrônicas e sobre os Tribunais Superiores. Isso quando não ultrapassou o mero limite da dúvida e afirmou a existência de fraudes tanto em uma quanto em outro. Chegado o período eleitoral, ele tinha ao seu dispor toda uma equipe de assessoria de campanha e, ao que se pode imaginar, da própria estrutura da Presidência da República e até mesmo de Steve Bannon, estrategista de Donald Trump. Todos sabiam que ao final do pleito só poderia haver dois resultados possíveis e, portanto, deveriam ter-se preparado adequadamente para cada um deles. Uma das ações necessárias nessa preparação seria elaborar a declaração do candidato após a divulgação do resultado. Em caso favorável, seria uma declaração de fácil composição, era comemorar a vitória, correr para o abraço, tripudiar e até mesmo ameaçar a esquerda derrotada, como fez em 2018. Em caso de derrota, o que felizmente ocorreu, poderia ter optado por, pelo menos, três caminhos: ou aceitar pacificamente o resultado e colocar-se explicitamente como o líder da oposição ao futuro governo; ou não aceitar o resultado e insurgir-se contra ele dentro dos marcos legais e afirmar que recorria à justiça para anular o pleito ou qualquer coisa parecida; ou ainda mesmo, sair dos marcos legais, afirmar que não reconhecia o resultado, que não sairia do Planalto e convocar seus apoiadores e até mesmo as forças armadas a ocuparem as ruas. Toda e qualquer escolha teria que ser planejada e minuciosamente avaliada em seus prós e contras. Mas o que se evidenciou foi que não apenas as eleições foram perdidas, mas também o próprio candidato derrotado ficou perdido, sem rumo e sem saber o que fazer, e com isso deixou seus apoiadores no vácuo por quase dois dias inteiros. E quando, finalmente, deu o ar de sua graça, para espanto geral, fez uma declaração pífia, indigna de qualquer pessoa que ocupa a cadeira do principal cargo político da nação.

Tanto Jefferson como Bolsonaro foram covardes. Nem um nem outro foram capazes de enfrentar a situação que tinham diante de si como verdadeiros líderes. Despojaram-se da aura “imbroxável” que tentaram construir e se mostraram na estatura que realmente são: homúnculos. Como o rei da história infantil, mostraram-se nus aos olhos da multidão. Sugere-se aqui que Jefferson deveria ter escolhido o caminho da própria morte ou Bolsonaro ter convulsionado o país? Certamente que não. Apenas se afirma que grandes líderes – notadamente os políticos – são pessoas que diante dos momentos difíceis e adversos ousam enfrentar a situação e levar suas escolhas às últimas instâncias Em ambos os casos, seus protagonistas poderiam, dentro das regras democráticas, marcarem suas posições e afirmarem suas lideranças. No entanto, se optassem por caminhos diversos, que fossem coerentes com suas escolhas e assumissem as consequências decorrentes, fossem elas quais fossem.

Para nós, felizmente, resta que se nem só de pão vive o homem, nem só de covardes vive a política brasileira. Temos na história recente, pelo menos dois exemplos disso. A então presidenta Dilma Rousseff, mesmo diante da certeza de que seria condenada ao impeachment num processo sabidamente farsesco, não se encolheu nem se escondeu dentro do Palácio do Planalto. Ao contrário, enfrentou bravamente o plenário do Senado, discursou e se defendeu a encarar seus algozes olhando-os nos olhos. Entrou e saiu daquela Casa de passo firme e cabeça erguida. Hoje é louvada por sua valentia e o TCU, finalmente, reconheceu que as famosas pedaladas, causa de seu afastamento, não passaram de golpe. Outro exemplo, Luiz Inacio Lula da Silva, também condenado em outro processo igualmente farsesco e conduzido por um juiz iníquo, enfrentou a prisão com galhardia, ficou 580 dias numa cela sem se deixar abater. Ao fim e ao cabo, foi libertado, teve sua inocência restabelecida, deu a volta por cima e venceu novamente as eleições presidenciais após lutar contra a maior campanha de calúnias que um brasileiro já sofreu ao longo da história. Hoje, ele voltou ao cenário mundial sendo reconhecido como um dos maiores estadistas do mundo contemporâneo. Resumo da ópera: cada um tem o líder que merece.

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1 O autor é servidor público, filiado ao PT, licenciado em filosofia pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e mestre também em filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).


Este artigo não representa necessariamente a opinião do pt.praxis.pro.br e é de responsabilidade do autor.

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